Tendência, estilo e movimento são algumas das categorizações mais recorrentes utilizadas nas tentativas de definir o conceito do brutalismo, termo utilizado para delinear um recorte de produções arquitetônicas situadas entre as décadas de 1950 e 1970 que guardam algumas semelhanças entre si, sobretudo no uso aparente dos materiais construtivos. Estabelecer uma definição precisa para o brutalismo, no entanto, mostra-se uma tarefa árdua, ainda que (ou, sobretudo porque) o termo tenha atingido grande alcance e, com isso, muitas tentativas de conceituação.
Os “enquadramentos” do que pode ser considerado o brutalismo são tantos quanto as definições as quais o termo pode assumir nos diferentes contextos em que é utilizado. As múltiplas versões não poderiam, portanto, ser consideradas de forma isolada ou desconexa do que entende-se por “brutalismo” nessas diferentes ocasiões. Nesse sentido, faz-se necessário um retrospecto do surgimento e difusão do termo para sua melhor compreensão.
Assim, cabe pontuar que historicamente o termo brutalismo se confunde com o chamado “Novo Brutalismo”, movimento que surge no contexto pós-II Guerra, tanto na arte como na arquitetura. Nesta última, os principais representantes são o casal Alison e Peter Smithson, considerados por muitos historiadores os “pioneiros” na produção de obras do Novo Brutalismo a partir dos projetos da Casa no Soho (publicada em 1953, mas nunca construída) e da Escola de Hunstanton (1950-1954).
A solidificação dos termos “Brutalismo” e “Novo Brutalismo” se deu sobretudo a partir de duas publicações, ambas do crítico Reyner Banham: The New Brutalism, artigo publicado em 1955 na Architectural Review, e o livro The New Brutalism: Ethic ou Aesthetic?, de 1966. Segundo a historiadora Ruth Zein, o autor foi “responsável pela cristalização de um mito de fundação que segue vincando fortemente a compreensão do Brutalismo”, em que muitas fontes historiográficas costumam tratar do termo a partir da aceitação, declarada ou não, das ideias lançadas por Banham.
O Novo Brutalismo, como define Reyner Banham, é simultaneamente uma espécie de rótulo – termo usado pelos historiadores para definir um conjunto de obras com similaridades entre si – e um slogan – um posicionamento conscientemente adotado por um grupo, independentemente da aparente semelhança ou dessemelhança das suas obras.
Se por um lado o Novo Brutalismo encontra-se em algum lugar entre rótulo e slogan, pode-se dizer que o Brutalismo é uma definição atribuída a posteriori para categorizar uma produção arquitetônica específica, aproximando-se assim, mais da definição de rótulo, tal como é entendida por Banham.
Na década de 1950, os primeiros exemplos de arquitetura brutalista apresentam uma característica significativa em comum: todos eles aparentam ser do que realmente são feitos. A partir do uso de materiais em seu estado bruto – em especial o concreto –, essas obras dão continuidade a um conceito utilizado alguns anos antes por Le Corbusier. O béton brut – concreto aparente –, inaugurado com a Unité d´Habitation de Marselha (1945-1949) é reconhecido por muitos historiadores como precedente do Brutalismo, ainda que naquele momento tivesse um sentido mais restrito, sendo utilizado para um exemplo isolado, e não como definidor de uma tendência, estilo ou movimento.
Se os primeiros exemplos de arquitetura brutalista surgem na primeira metade da década de 1950, sua difusão em todo o mundo se dá principalmente nas duas décadas seguintes. O conjunto dessa produção, intensificada progressivamente, é marcado não apenas pela proximidade das características plásticas e construtivas, mas também pelas peculiaridades que assumem entre si. Exemplos de arquiteturas brutalistas em países como Brasil, Índia, Canadá, Israel, Sérvia e Polônia – além de uma série de outros países e regiões – demonstram a variedade de interpretações do conceito.
Ao longo do tempo, o brutalismo também sofreu derivações do seu significado, aparecendo, por exemplo, em tentativas de qualificar edifícios - e até mesmo objetos - concebidos em outros recortes temporais. Entendido de forma vaga, aplicado a partir de uma aproximação plástica superficial, se distancia daquele utilizado para definir o que pode ser considerado como um desdobramento da arquitetura moderna.
As interpretações, sejam elas nas obras arquitetônicas ou nas tentativas de conceituação do termo, invariavelmente levaram a uma variedade de significados do que é o brutalismo, brevemente apresentados neste artigo. Essas definições, leituras e releituras não são únicas ou limitadas, e devem ser entendidas como parte de uma rede mais ampla de relações abertas à interpretação.
Referências bibliográficas
BANHAM, Reyner. The New Brutalism. Architectural Review, vol.118, n. 708, dez. 1955, p. 355-361.
ZEIN, Ruth Verde. Brutalismo, sobre sua definição. (ou, de como um rótulo superficial é, por isso mesmo, adequado). Arquitextos, São Paulo, ano 07, n. 084.00, Vitruvius, mai. 2007.